O Conselho (Concílio) Mundial de Igrejas

O movimento ecuménico moderno é de origem protestante, e o seu choque inicial deu-se durante a primeira Conferência Mundial de Missões reunida em Edimburgo (1910). Dos 1200 delegados presentes, só 18 eram não europeus (ou descendentes de europeus). Mas foi de um deles, Cheng JingYi – então pastor-adjunto (ainda não ordenado) de uma Igreja evangélica plantada pela London Missionary Society em Pequim – que se ouviu o apelo que abalou as consciências: “Vocês enviaram-nos missionários que nos fizeram conhecer JesusCristo, e estamos gratos por isso. Mas trouxeram-nos também as vossas divisões. Pedimos que deixem que seja Jesus Cristo, Ele mesmo, a suscitar no seio dos nossos povos, por acção do Seu Espírito, a Igreja adequada às Suas exigências, e adequada também ao carácter da nossa raça, que será a Igreja de Cristo no Japão, a Igreja de Cristo na China, na Índia, etc. Libertem-nos de todos os ‘ismos’ com que afectaram a pregação do Evangelho entre nós.” E disse ainda: “Para falar claramente, nós esperamos ver, no futuro, uma Igreja Cristã unida sem quaisquer distinções de denominação.” Outro delegado asiático, V. SamuelAzariah (mais tarde o primeiro Bispo Anglicano autóctone de Dornakal, Índia), falou da relação muito desigual entre o missionário europeu “patrão” e o pastor local “criado”, chegando a dizer: “Too often you promise us thrones in Heaven, but will not offer us chairs in your drawing rooms.” (Vocês prometem-nos muitas vezes tronos no Céu, mas não nos oferecem cadeiras na vossa sala de estar…)

Logo após a I Guerra Mundial, três outros apelos se seguiram: o do Arcebispo Luterano de Uppsala (Suécia), Nathan Soderblom, que promoveu a Conferência de Estocolmo de 1925, que viria a estar na origem de um dos dois “pilares” do futuro Conselho Mundial de Igrejas, “Vida e Acção” (o outro, já acima citado, é “Fé e Ordem”). A Encíclica do Patriarcado Ecuménico de Constantinopla, de 1920, com o título original, na versão em inglês, Unto All the Churches of Christ wheresoever they be. E o documento An Appeal to All Chistian People, aprovado na Conferência de Lambeth (Com. Anglicana) tambémem1920 – a que o Patriarca Ecuménico de Constantinopla respondeu favoravelmente.

É notável, neste último apelo (Anglicano), o cuidado com que se propõe uma aceitação do modelo episcopal assente num reconhecimento recíproco dos ministérios ordenados, sendo a função “exercida de uma forma representativa e constitucional”. As duas frases finais mantêm toda a pertinência: “Não pedimos que qualquer Comunhão consinta em ser absorvida por outra. Nós pedimos que todas elas se reúnam num novo e grande projecto (endeavour, no original), para recuperar e manifestar ao mundo a unidade do Corpo de Cristo, pela qual Ele orou.”

Luteranos e Reformados, Anglicanos e Ortodoxos, encontram-se nessa Conferência de Estocolmo em Agosto de 1925, 1600 anos exactos depois do I Concílio de Niceia. Foi recitado o Credo de Niceia, foi cantado o Te Deum (em latim) e depois, em quatro línguas, o “hino de combate” da Reforma, atribuído ao próprio Lutero – Ein feste Burg ist unser Gott (O nosso Deus é uma firme fortaleza), inspirado no Salmo 46. Todos disseram depois, cada um na sua língua, o texto do “Pai Nosso”. Nathan Soderblom (mais tarde galardoado com o Prémio Nobel da Paz) proferiu na sessão de encerramento uma frase famosa, que caracteriza, até hoje, um dos problemas maiores do movimento ecuménico propriamente dito: “João esteve presente. Paulo esteve presente. Mas Pedro não esteve presente…”

Este texto de Silas Oliveira sobre o movimento ecuménico foi inicialmente publicado na “Revista Lusófona de Ciência das Religiões” (2012), como trabalho final do curso de formação avançada sobre Jornalismo e Religiões, promovido pela Universidade Católica Portuguesa e o CENJOR em 2006/2007

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